O Ethereum já consolidou sua posição como a segunda maior blockchain do mundo e se mostrou resistente aos chamados “Ethereum killers” que surgiram ao longo dos anos. Porém, a rede ainda agora o desafio de crescer e manter sua relevância no mercado sem perder sua essência descentralizada.
Uma das pessoas no centro dessa missão é Tomasz K. Stańczak, engenheiro polonês que deixou o mercado financeiro tradicional para ajudar a moldar o futuro do Ethereum.
Ele já passou pelo Citibank e fundou a Nethermind, empresa de soluções de infraestrutura focada na rede por trás do ETH. Desde abril deste ano, atua como codiretor executivo da Ethereum Foundation — a principal instituição de apoio ao ecossistema da criptomoeda.
Durante sua passagem pelo Brasil para participar do ETH Latam, Stańczak conversou com o Portal do Bitcoin sobre o vigor das comunidades locais e elogiou o sistema de pagamentos instantâneos brasileiro. “O Pix é uma referência mundial. Quando você o combina com o Ethereum, tem o melhor dos dois mundos”, disse.
Ele também defendeu a influência de Vitalik Buterin no ecossistema do Ethereum, apesar das críticas sobre uma possível concentração de poder, fazendo uma distinção importante: “Vitalik tem legitimidade e ótimas ideias, mas seu papel não está inscrito no protocolo. Ele é influente por méritos, não por autoridade.”
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Stańczak ainda falou sobre o papel da Ethereum Foundation na cooperativa do ecossistema e sobre os riscos de cair no que ele chama de “feudalismo digital” — a concentração de poder tecnológico em poucas mãos.
Confira abaixo a entrevista completa:
Portal do Bitcoin: Hoje a Fundação Ethereum publicou o “The Trustless Manifesto”, escrito por Vitalik Buterin, que reafirma o compromisso do Ethereum com a construção de sistemas descentralizados. Esse manifesto representa o foco atual da Fundação?
Tomasz: Eu acho que a ideia de trustless — operar sem precisar confiar em terceiros — são conceitos extremamente importantes para como o Ethereum funciona. Quando falamos sobre a Fundação Ethereum e os valores que gostaria de definir para o Ethereum, é importante lembrar que o Ethereum é um conceito maior, que pertence a todos. Cada um pode ter visões diferentes, mas a Fundação fala sobre resistência à censura, acesso à rede de código aberto, e a promoção de soluções de rede aberta na sociedade.
Privacidade e segurança por padrão para todos. Qualquer solução que requeira confiança está em risco de alguém censurar a parte confiável, ou de uma parte confiável censurar alguém. O manifesto, em si, é uma resposta a isso. É um conjunto de soluções, e eu concordo com as ideias do manifesto. Não é um ataque a ninguém, é um guia e um encorajamento para continuarmos trabalhando em direção a essa solução central.
Este ano vimos muitos episódios ruins, em que desenvolvedores de carteiras como o Tornado Cash e a Samurai Wallet enfrentaram repressão governamental. O manifesto aborda isso de certa forma?
Tomasz: Há definitivamente uma conexão. Qualquer solução que não dependa de terceiros, de atores censuráveis, significa que você não está vulnerável à repressão. Mas mesmo que os implantadores originais sejam seguidos, a solução continua funcionando. É decepcionante quando projetos criados para proteger a privacidade sofrem consequências por mal-entendidos. Às vezes, os governos têm dificuldade em evitar efeitos colaterais.
O Ethereum é um projeto descentralizado, mas a Fundação é uma entidade centralizada que tem um papel central no apoio ao ecossistema. Como você equilibra essa tensão? Há críticas também sobre a grande influência de Vitalik Buterin na rede. Você acha que elas fazem sentido?
Tomasz: Primeiramente, não concordo que a Fundação tenha um papel central no ecossistema. Ela tem um papel e tenta ser a mais eficaz possível, mas há muitos outros operadores. Você realmente não deveria encontrar um “centro” no interior. É uma rede. Há diferentes forças de poder, e elas são muito dinâmicas.
O design do Ethereum é feito para que, quando algo tenta dominar a rede, surja atrito. Seja um validador, um pesquisador, um coordenador da Fundação ou um investidor, todos esses papéis se equilibram.
Você tem o Vitalik — ele é muito respeitado, tem legitimidade e ótimas ideias. Isso é inconveniente. Mas esse papel não está inscrito no protocolo. Se um dia ele se tornar errático, as pessoas procurariam outras soluções. Ele é ouvido por mérito, não por autoridade.
Olhando para o mundo de hoje: o que você acha que está “quebrado” e que o Ethereum pode ajudar a consertar?
Tomasz: Há 10 ou 15 anos, quando falávamos sobre Bitcoin e blockchain, o foco era o acesso financeiro sem intermediários. Falávamos de pagamentos crossborder, instrumentos básicos de rendimento e acesso a juros.
Com o DeFi, stablecoins e DAOs, avançamos muito. Hoje é mais fácil contratar globalmente, processar pagamentos e reduzir custos, com menos risco de censura. Ainda há o que melhorar, mas é uma revolução bem-sucedida.
Nos próximos 10 anos, o desafio muda: a centralização da inteligência artificial e da automação. Eu chamo isso de feudalismo digital. O poder de supervisão global da IA é uma das maiores ameaças à sociedade. O Ethereum é fantástico para resolver desafios de centralização — então é quase como se tivéssemos encontrado um novo campo de batalha.
E a computação quântica? É uma preocupação?
Claro. O projeto Lean Ethereuminiciado por Justin Drake, trabalha com segurança pós-quântica. Ele mostra como seremos seguros e traz um roteiro para implementar essas soluções no protocolo.
No início de dezembro o Ethereum recebe uma nova atualização chamada Fusaka. O que ela vai abordar?
A Fusaka é a segunda grande atualização do ano, o que é incomum. Antes fizemos interrupções de um ou dois anos. Ela traz escalabilidade para a segunda camada, com a entrega do PeerDASque aumenta a disponibilidade de dados para os rollups. Isso garante mais segurança e desempenho.
Também inclui melhorias de experiência do usuário com suporte a chaves de acesso e novas curvas criptográficas, além de preparar o terreno para futuras otimizações. Em resumo: é um avanço em escalabilidade e UX.
Então resolver o problema da escalabilidade é a prioridade atual do Ethereum?
Tomasz: Sim. A Fusaka é focada em escalabilidade. Aumentamos o tamanho padrão de blocos para 60 milhões, o que representa cerca de 33% de melhoria. Os validadores têm autonomia, mas a recomendação é bem testada.
Ó PeerDAS também melhorou as segundas camadas em até 16 vezes. Estamos iniciando um novo ciclo de escalabilidade. Entre este ano e o próximo, recomendamos ver até 10 vezes de melhoria.
E as próximas atualizações continuarão focando nisso? O que podemos esperar para o futuro do Ethereum?
Tomasz: Sim. A bifurcação de Amsterdã, prevista para o próximo ano, continua na linha de escalabilidade. Há também discussões sobre mecanismos de resistência à censura e ajustes de desempenho. É uma evolução constante.
Todo ano surgem “assassinos de Ethereum”. O que diferencia o Ethereum dos concorrentes, além do fato de que o Ethereum surgiu primeiro?
Tomasz: A diferença é o longo prazo. O Ethereum é construído para resistir a choques — de mercado, tecnológicos ou políticos. Redes que buscam vantagens rápidas são frágeis. O Ethereum sobreviveu porque é descentralizado por design.
Além disso, com as soluções de segunda camada, oferecemos espaço de customização sem sacrificar a segurança. É escalar e experimentar sem reconstruir tudo possível do zero.
O Ethereum sempre foi a casa dos hypes do mercado criptográfico, como os NFTs, ICOs e memecoins, mas as coisas estão mais calmas nos últimos tempos. O está sendo construído agora que você anima?
Tomasz: Este ano, a paixão é mais institucional. Grandes empresas e operadores de pagamento estão construindo sobre o Ethereum. Talvez o público não veja o mesmo hype, mas há mais uso real do que nunca.
Pagamentos cross-border, stablecoins e custos mais baixos, tudo isso roda sobre o Ethereum. Hoje, 61% dos stablecoins estão na mainnet, e esse número só cresce.
Você teme que o aumento do investimento via ETFs e empresas comprando ETH para suas tesourarias traga algum tipo de risco de centralização?
Tomasz: Não. A estrutura de governança e o consenso técnico do Ethereum impedem isso. Mesmo que grandes investidores participem, eles não podem ditar boatos. O capital ajuda a fortalecer a segurança da rede, mas não define seu futuro.
Você está no Brasil pela primeira vez e vemos aqui uma comunidade que só cresce em torno do Ethereum. Como comunidades locais, como a do Brasil, ajudam a fortalecer a rede?
Tomasz: Eu estou muito parecido. A adoção institucional é forte. O Brasil é o terceiro país no mundo em uso de stablecoins locais, atrás apenas do dólar e do euro.
O ETH Latam foi incrível: ótima atmosfera, discussão rica, foco em pagamentos e DeFi. Achei o Pix um sistema admirável. Muitos países o observam com inveja. E quando você combina isso com o Ethereum proporciona aspectos cross-border, privacidade, então, com o tempo, acho que podemos ver o melhor dos dois mundos juntos.
O Brasil tem descentralização até na cultura, cada região tem sua identidade, suas comunidades. Vejo pessoas nas favelas, comunidades indígenas, desenvolvedores talentosos. Tudo isso forma um ecossistema vivo. Há cerca de cinco milhões de desenvolvedores no país, e muitos estão no Ethereum.
A Fundação é muito importante com esse crescimento. Estamos mudando um modelo de financiamento direto para mais apoio por meio de mentoria, marketing e participação. Queremos comunidades completas, que incluam fundadores, investidores, artistas e educadores.
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Fonteportaldobitcoin



