Em menos de um ano, o mundo financeiro levou dois chacoalhões provocados pelo mesmo aspecto: o avanço dos mercados preditivos. Em novembro de 2024, enquanto institutos tradicionais apontavam uma disputa acirrada entre Donald Trump e Kamala Harris, o Polymarket se antecipou com folga a vitória do republicano — que se confirmou nas urnas.
Agora, em outubro deste ano, o fundador da Polymarket, Shayne Coplan, tornou-se o mais jovem bilionário sem herança ao alcançar uma fortuna bilionária aos 27 anos. O salto patrimonial veio após a Intercontinental Exchange (ICE), controladora da Bolsa de Valores de Nova York (NYSE), investir US$ 2 bilhões na plataforma.
Os dois exemplos mostram como o A Polymarket se tornou um dos gigantes do mercado financeiro global. Mas, mais que isso, ele é a ponta de lançamento de uma preocupação que dá ameaças de ter alcance profundo e com escala global: a “preeditização” do mundo, quando todas as aparências mensuráveis, naturais ou sociais, serão objeto de apostas.
No Brasil, esse parece ainda ofuscado pela onipresença das apostas, as casas de apostas que se concentram principalmente em eventos esportivos. Mas com razão essa clara predileção do brasileiro por apostar e o cenário do ano que vem são elementos que fazem crer que é questão de (pouco) tempo para o Polymarket e seus concorrentes se massificarem no país.
Quem acompanha de perto essa tendência é Felipe Sant Ana, fundador da Paradigma Education, que há anos se debruça sobre o universo criptográfico e, mais recentemente, tem treinado com profundidade o avanço dos mercados preditivos. Para ele, o impacto por aqui tende a ser ainda maior.
“Acho que o efeito aqui no Brasil vai ser ainda mais dramático. Porque o brasileiro ama apóstar, ama ter a chance de ganhar dinheiro por estar certo e porque ano que vem tem eleição e Copa do Mundo. São os dois eventos que a gente mais gosta de especular informalmente sobre”, afirma.
Sant Ana lembra que um dos motivos que tem feito o Polymarket acerta mais que institutos de pesquisa em alguns cenários é o fato de que o mercado preditivo tem uma mão no pulso imediato dos fatos, o que não ocorre com metodologias tradicionais.
“Por melhor que seja a metodologia, a amostragem e o processo de uma pesquisa eleitoral, aqui no Brasil esse processo é regulamentado e não é livre. Para divulgar os resultados, é preciso registrar a pesquisa, seguir uma série de regras, e isso impede que se faça levantamentos diários em grande volume. Já os mercados preditivos funcionam 24 horas por dia, reagindo a todas as novas informações que surgem. Esse mecanismo se mostra mais sensível, atualizado e, muitas vezes, mais preciso”, explica.
Ele acrescenta que, por isso, essas plataformas já funcionam como “oráculos do nosso tempo”, com valor ainda maior em situações em que o fluxo de informação é restrito — como no caso de interesses eleitorais, capazes de influenciar a história de um país.
Uma observação relacionada ao interesse
Existem alguns campos da física que estudam um enigma: quando o mero ato de observar uma ocorrência ou alteração, torna impossível uma medição pura. Nenhum mercado preditivo ocorre o mesmo, pois quando milhões de dólares estão em jogo em uma aposta, os agentes que podem manipular o resultado o tenderão a fazê-lo.
Sant Ana detalha como os mercados preditivos influenciam os eventos sobre os quais se apostam. Segundo ele, a própria formalização de preços e probabilidades já altera a dinâmica dos resultados. “Um exemplo foi a última chamada de resultados da Coinbase, com um mercado de menções, em que se apostava quais palavras seriam ditas no discurso. O CEO, Brian Armstrong, acabou lendo as apostas enquanto apresentadas os resultados, e muita gente reclamou que ele teria manipulado o mercado. Na minha leitura, não foi ele que manipulou, foi o mercado que influenciou o comportamento dele”, explica.
Ele acrescenta que, de forma mais ampla, a existência de recompensas explícitas acelera o surgimento de certos resultados. “Hoje, por exemplo, existe um prêmio em Bitcoin para quem construir primeiro um computador quântico relevante. Esse prêmio acelerou a evolução da tecnologia, antes mais lenta. Mercados preditivos funcionam de maneira semelhante: fazem emergir informações que antes estavam restritas ou escondidas, trazendo probabilidades à tona de forma mais rápida.”
Para Sant Ana, embora esses mecanismos sejam positivos para a sociedade, há limites práticos: “Mercados que dependem do livre-arbítrio de uma única pessoa, como o de menções, tendem a desaparecer não por regulação, mas porque os apostadores percebem que estão investindo em resultados que alguém controla. Com o tempo, aprendem quais mercados realmente têm valor e quais não.”
Mercados preditivos e apostas
Mercados preditivos e casas de apostas podem parecer muito parecidos — e, em vários aspectos, são. Ambos envolvem dinheiro em risco para tentar antecipar um resultado futuro, e ambos podem operar em categorias de entretenimento e esportes. Mas, segundo o especialista Felipe Sant Ana, há distinções importantes no modo como esses mercados funcionam. Ele explica que os preditivos se estruturam, sobretudo, em torno de acontecimentos em que há disputa por informação e atualizações constantes, como eleições ou decisões políticas.
“Até pouco tempo, no Brasil, para ter uma pesquisa de intenção de voto atualizada era preciso esperar dias ou semanas, e apenas algumas empresas controlavam o fluxo de informação. Agora, com os mercados preditivos, qualquer pessoa pode acompanhar diariamente as chances de um candidato”, afirma.
A discussão ganha peso quando se observa o impacto crescente das apostas na economia brasileira. Um estudo divulgado neste mês pela Agência Brasil estima que jogos de azar e apostas online causam perdas sociais anuais de R$ 38,8 bilhões — valor que inclui custos associados a individualização, problemas de saúde, afastamentos do trabalho, desemprego e até suicídios. Para dimensionar a escala, esse montante equivaleria a 26% do orçamento da Minha Casa, Minha Vida do ano passado ou a 23% de acréscimo no Bolsa Família de 2024.
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Fonteportaldobitcoin



